segunda-feira, 5 de outubro de 2015

Entrevista com os autores de "Marca: do marketing ao balanço financeiro"

Os professores Marcondes Neto e Mariza Freitas estão lançando, pela EdUERJ, o livro "Marca: do marketing ao balanço financeiro", na quinta-feira, 8 de outubro, na Casa Dirce Cortes Riedel. Eles conversaram com o Blog da EdUERJ sobre questões levantadas pelo livro.


Como foi o processo que levou à criação de "Marca: do marketing ao balanço financeiro"?

Marcondes Neto: Após o processo de preparo da dissertação, e diante da riqueza do material obtido, decidimos juntos que o tema poderia render mais, unindo a visão contábil-financeira (original da área em que foi desenvolvida a dissertação, no Mestrado em Ciências Contábeis da FAF/UERJ) à de marketing (onde se desenvolveu a disciplina branding - de gestão de marcas). E não criou-se só um livro, mas um projeto de pesquisa com blog na internet (que realmente foi criado:http://brand-forum.blogspot.com.br/) - que já-já será transformado em website.

Mariza Freitas: Durante o desenvolvimento da dissertação, identificamos certa carência de publicações brasileiras sobre o assunto, e como também havia o ineditismo do case de rebranding da Arthur Andersen, imaginamos que seria uma boa oportunidade de contribuir para os estudos na área.

Para que público este livro é indicado?

Marcondes Neto: Estudiosos do tema branding. Para além de estudantes, profissionais, professores e pesquisadores das marcas comerciais na Contabilidade e no Marketing, também pessoas na Administração, na Comunicação, no Design, na Economia e nas Finanças.

Mariza Freitas: É um livro multidisciplinar.

Qual a maior dificuldade para mensurar o valor de uma marca? 

Mariza Freitas: Primeiramente, cabe dizer que a mensuração de valor de uma marca, em linhas gerais, pode ser: (1) qualitativa, em que se avaliam, por exemplo, as medidas de lealdade à marca, qualidade percebida, associações, conhecimento e comportamento de mercado. A isso denominamos brand equity; e (2) quantitativa, em que se atribui um valor monetário à marca, seja para uma avaliação técnica (foco financeiro baseado em um modelo estático) ou gerencial (foco estratégico baseado em um modelo dinâmico). A isso denominamos brand value.
Em segundo lugar, que essa valoração monetária da marca pode ser feita com diversos propósitos, tais como: venda do ativo, licenciamento de uso, planejamento orçamentário, decisão de investimentos, entre outros.
Seja qual for a perspectiva, qualitativa ou quantitativa, a maior dificuldade para essa mensuração está na subjetividade intrínseca das variáveis que serão utilizadas, e na indefinição de um conjunto ótimo de variáveis e da sua ponderação dentro do modelo. Outro fator a ser considerado é a diversidade de metodologias existentes, haja vista que ainda não temos definido pela literatura qual método melhor se aplica a cada propósito.

O Brasil está passando por uma modificação para se adaptar aos "International Finance Reporting Standards". Qual é a principal diferença em relação às normas adotadas anteriormente?

Mariza Freitas: Diferentemente do tradicional sistema contábil brasileiro, baseado em regras bem definidas (rules-based) e fortemente influenciado pelo ambiente fiscal, as normas internacionais fundamentam-se em princípios conceituais (principles-based) e apresentam ênfase na substância econômica das operações e no exercício de julgamento dos profissionais da área contábil. Sob esta nova perspectiva, mais subjetiva e discricionária, essas normas privilegiam a essência sobre a forma a fim de que as informações contábeis representem adequadamente os fatos e a real posição financeira da entidade, e forneçam uma visão justa e verdadeira (true and fair view) da organização.

Atualmente é possível uma empresa estar consolidada no mercado sem um trabalho especial envolvendo sua marca?

Marcondes Neto: Não. Branding, hoje, como disciplina de negócios, praticamente substituiu o Marketing. Fica impossível, atualmente, começar um negócio sem marca, ou começar com o conceito errado de marca. Corrigir depois é um desastre. Marca tem que ser pensada no início, assim como se pensa em sede, fontes de financiamento e de suprimento, gestão de pessoas.

Mariza Freitas: No que entendemos como o conceito de mercado no mundo atual, não. As organizações precisam do branding para se consolidar. Isso, porém, nem sempre é verdade em outros tipos de mercado.

Em mercados não competitivos, monopolistas ou comoditizados, a marca é apenas um símbolo nominativo e identificador da origem do bem, apresentando um valor econômico muito baixo, haja vista que o mais importante para o consumidor é o desempenho do produto em relação à sua funcionalidade, seu preço e sua utilidade. Nesse ambiente, as empresas não costumam investir muito na consolidação da sua marca, pois o foco estratégico, em geral, é o quantitativo de produção, objetivando atingir o maior nível possível de economia de escala para minimização de custos.
Já em mercados competitivos, torna-se necessária a incorporação de uma nova competência: o marketing de produtos e serviços, representando a capacidade de convencer os consumidores a comprar a sua marca e não a da concorrência.

Os mercados globalizados, mais amadurecidos e com consumidores altamente exigentes e altamente competitivos, obrigam as empresas a, primeiramente, conhecer o seu público alvo em profundidade e, em seguida, a estabelecer um relacionamento duradouro com esse público. Para isso, a empresa precisa criar um canal de comunicação consistente e eficaz que represente não apenas o seu produto, mas também a sua cultura, seus valores e propósitos E esse canal é a marca. Aqui, ela se torna a interface, o elemento de união da empresa com a sociedade, ganhando status de ativo estratégico de suma importância para a sustentabilidade da organização e, portanto, demandando todo um “trabalho especial” de gestão da marca.


Um dos atrativos do livro está nas entrevistas que vêm como apêndice. Gostaria que os autores falassem um pouco sobre esse material.

Mariza Freitas: Esse material é a transcrição das respostas ao questionário da pesquisa e consiste, basicamente, nas opiniões de acadêmicos e profissionais de diversas áreas (representando a multidisciplinaridade do estudo) sobre a importância das marcas para organizações hoje e no futuro; as restrições normativas à contabilização das marcas, suas causas e seus impactos; as metodologias de avaliação das marcas; e os aspectos gerais do ambiente contábil para a contabilização das marcas como ativo intangível das empresas.

O livro traz o caso de rebranding de Andersen Consulting para Accenture. Como surgiu ideia da inclusão desse capítulo e sua importância no contexto do livro.

Marcondes Neto: Foi uma oportunidade única de apresentar o caso ao Brasil. A Accenture tem escritórios no Rio e em São Paulo, lidera o segmento de consultoria de gestão empresarial e tecnologia da informação, mas o rebranding ainda não havia sido contado, apesar da operação brasileira ter sido uma das mais bem sucedidas em todo o mundo na operação da migração da marca Andersen Consulting para Accenture. A construção de uma marca; todo o processo de pesquisa que o antecede e todo o trabalho envolvido em difundi-la globalmente está lá, narrado por quem o viu de perto.

Hoje, algumas empresas produzem uma divulgação institucional que às vezes recai no "politicamente correto", como se sentissem obrigadas a se associar a questões como a proteção ao meio ambiente, ao combate à miséria ou na luta contra doenças. Até mesmo as multinacionais do cigarro investem em pesquisas que demonstrem os benefícios da indústria do fumo. Por outro lado, é muito comum a desconfiança do consumidor em relação a essas ações, descrédito que aumenta quando os serviços prestados pelas empresas ignoram os direitos/anseios básicos do consumidor. O resultado disso é uma distância entre como um cliente vê uma determinada marca e a imagem que ela pretende transmitir. Esse é um fenômeno mundial ou acontece mais em países pouco desenvolvidos, onde há falta de transparência e os direitos de consumidor são ignorados?

Marcondes Neto: O fenômeno do "politicamente correto" é global. Assim como as marcas. E, sim, nos países menos desenvolvidos há menos compromisso entre as promessas e as "entregas" feita pelas empresas. O caminho para encurtar a distância entre o que se diz e o que se faz é mais educação da população para a sedução da mídia e para o chamamento do consumo. Consumidores-cidadãos são mais exigentes. E as marcas de produtos e de empresas - que também querem ter cidadania empresarial pela conduta ética e responsabilidade socioambiental - precisam ser resultado de evolução de práticas empresarias mais justas, menos poluentes e mais transparentes. E não mera propaganda ... do tipo enganosa.

Mariza Freitas: Em geral, em países mais desenvolvidos, a sociedade é mais culta e exigente e, por isso, menos tolerante a dissonâncias entre a imagem projetada e a prática das organizações. Nesse caso, as empresas não apenas precisam mostrar uma imagem, mas, de fato, provar que suas ações são compatíveis com aquilo que comunicam a seus stakeholders. Isto é, que há coerência e alinhamento entre seu discurso e sua prática, ou melhor, entre o que marca comunica, o que a empresa entrega e o que o consumidor percebe.

Já nos países menos desenvolvidos, onde os mercados por vezes margeiam o monopólio e a "comoditização", esse alinhamento costuma ser menos frequente. O problema é que isso, infelizmente, nem sempre representa prejuízo econômico para as empresas que operam nesses mercados. 

Qual a maior qualidade do livro "Marca: do marketing ao balanço financeiro"?

Marcondes Neto: É seu aspecto pioneiro, discutindo um tema que é desafio em todo o mundo, ao mesmo tempo, hoje: como aproximar valor de mercado (aquele percebido) do valor que efetivamente a empresa pode lançar em seu balanço financeiro. Como se sabe, a Contabilidade deve ser o retrato fiel - em números - das operações de um dado negócio. Quando o discurso sobre "valor" alcança cifras gigantescas, é preciso ligar a luz amarela nas decisões financeiras em operações de fusões e aquisições de empresas, por exemplo. Neste assunto, vale a desconfiança popular sobre se uma mercadoria "vale mesmo o tanto quanto pesa"... ou alardeia que pesa.

Mariza Freitas: A sua multidisciplinaridade. Oferecer uma reflexão simplificada e abrangente sob diversos aspectos de um tema atual e controverso. 

Por fim, o Blog da EdUERJ deseja sucesso ao lançamento do título!

Marcondes Neto:

Somos gratíssimos pelo endosso que a EdUERJ dá a mais este trabalho produzido nas entranhas da Universidade.

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